Café Royal – Londres
Diário da Manhã
Publicado em 13 de dezembro de 2017 às 23:56 | Atualizado há 7 anosComo disse em um dos textos que publiquei no face book, nesta viagem que Marilia e eu estamos realizando (Paris e Londres), duas razões nos levaram a empreendê-la: procurar algumas incongruências de detalhes de algumas antigas crônicas que venho escrevendo há algum tempo sobre estas duas cidades, para possível publicação, em livro, e, em segundo lugar, voltar a acompanhar os passos de Couto de Magalhães, ex-presidente da Província de Goiás em 1863, que morou em Londres por 4 anos, sobre o qual publiquei o livro (biografia romanceada): “Couto de Magalhães, o último desbravador do Império, Ed. Kelps”.
Quando publiquei este livro baseei-me em muitas pesquisas biográficas, inclusive no “Diário secreto” que ele deixou e que foi publicado no Brasil pela “Cia. das Letras, 1998”, quase todo ele discutindo sua vida em Londres, inclusive uma namorada que ele “arranjou” de nome Lily,
Uma das incógnitas que não consegui desembaraçar é a possibilidade dele ter sido homossexual, como afirmam algumas fontes, sem comprovação documental e, como toda biografia, para merecer o crédito dos leitores, não pode “esconder” detalhes da vida do biografado, mesmo aquelas que poderiam “denegrir” a sua imagem.
Na dúvida e para não fugir do problema, “levei” Couto de Magalhães, na companhia de Lily, a um restaurante muito famoso naquela época em que ele viveu em Londres (1876/1880), o famoso Café Royal, local onde Oscar Wilde frequentava, como nos informa o autor de uma das suas biografias, Richard Ellmann (como sabemos, Oscar Wilde estava envolvido na época, era Vitoriana, em um processo sobre pederastia, acabando por ser preso e da prisão escreveu o famoso opúsculo – “The Profundis”).
Como esta biografia é romanceada, acompanhem comigo o diálogo que arranjei entre os dois (Couto de Magalhães e Lily)
(….) No dia anterior brigaram, Lily tivera um ataque histérico. Couto verificou, pelo humor da companheira, que aquele assunto do dia anterior ainda não estava resolvido, pensou em ir para casa, porém percebeu que esta solução não seria a mais adequada, pois a noite, como vimos, foi terrível.
Convidou-a a irem ao restaurante Pantagruel, porém, ela insistiu que desejava ir ao Café Royal; ali, um pouco contrariado pelo inusitado da cena, Couto teve a oportunidade de ver uma pessoa que estava fazendo enorme sucesso literário em Londres, principalmente pelos modos extravagantes de se vestir e também pelo séqüito que o acompanhava.
Acostumado ao tradicionalismo, Couto, ao contrário de Lily, ficou abismado com o grupo que ocupava uma mesa no fundo do restaurante e que se comportava de maneira a chamar a atenção dos presentes.
O comandante do grupo era um homem jovem, alto, rosto redondo, cabelos castanhos, lisos e abundantes; boca bem formada, porém, com lábios grosseiros, usava roupas espalhafatosas, com uma enorme flor branca na botoeira da jaqueta. Os punhos da camisa recobriam as mangas do paletó; fazendo saliência e chamando a atenção, um enorme e pesado selo de metal, exibindo a inscrição das letras OW estilizadas, pendiam da corrente do relógio.
Para completar a indumentária, era exibido um grande diamante no peitilho da camisa. Falava alto, porém, com voz encantadora, sonora e suave, cheia de expressão e modulações, sendo ouvido por todo o restaurante; recitava poemas entremeados com “tiradas” que provocavam estrondosas gargalhadas nos seus companheiros.
Era Oscar Wilde, famoso romancista, poeta, teatrólogo e conferencista.
Lily ficou entusiasmada com a coincidência, acompanhava-o pela imprensa e aprovava sua filosofia de vida, completamente contrária aos costumes vigentes da era Vitoriana, principalmente suas opiniões a respeito do relacionamento entre os casais; a custo, foi contida por Couto para não se dirigir à mesa do Dandi.
A atitude de Lily provocou mau humor em Couto; a muito custo mantiveram uma conversação durante a refeição; para piorar a situação, ela resolveu cobrar-lhe uma posição frente ao homossexualismo, uma vez que, segundo ela, ele havia demonstrado, no presente episódio, evidente e exagerado preconceito.
– Não tenho preconceito, acho que cada individuo deve ser senhor das suas opções sexuais, só não concordo com o exibicionismo, semelhante ao praticado por este indivíduo, há que haver o respeito público.
– Acho-o, realmente, preconceituoso; haja vista o fato de você não ter me levado ao jantar na casa do Barão de Penedo. Você me despreza, sua atitute foi covarde, você agiu como um covarde, fala agora a já quase histérica Lily.
– A única coisa que não admitido é ser chamado de covarde; se você conhecesse minha vida pretérita, não teria coragem de dizer isto. Covarde é aquele que foge do perigo; ao contrário disto, fui, muitas vezes, ao encontro do perigo e desafiei-o inúmeras vezes (….)
Marilia e eu fomos almoçar no famoso café Royal, localizado na Regent Street, quase que chegando no Picadily; é interessante aguçar a curiosidade dos meus leitores, contando um pouco da história deste Café:
– Em 1865 um casal de franceses (Daniel Thévenom e Celestine, fugindo de dívidas que fizeram em Paris, foram para Londres, onde fundaram o “Café Royal”, que logo tornou-se o local de encontro de celebridades, por fornecer aos clientes os melhores vinhos, muitos deles, vindos da França.
Provavelmente, pela sua localização (Regent Street), este café adquiriu grande fama e foi frequentado por pessoas de grande repercussão social ( Oscar Wilde, Virginia Wolf, Winston Churchil, Bernard Shaw e mais recentemente Elizabeth Taylor, Brigitte Bardot e a Princesa Diane.
Está registrado na história que no dia 24 de março de 1895, Oscar Wilde se encontrou com um dos seus amigos, Frank Harris e este tentou convencer o amigo a desistir de processar o pai do seu “namorado (Alfred Douglas)”, o Marques de Queensbery; infelizmente Wilde não quis ouvir os conselhos do amigo e acabou sendo condenado e preso.
Em 2008 o Café fechou as portas e no ano de 2012, reabriu-a, agora com “status” de Hotel 5 estrelas, permanecendo, no entanto o recanto para os boêmios degustarem um bom vinho, champanhe ou uma larger (cerveja quente dos ingleses) e também, com provar um bom carneiro assado.
(Hélio Moreira, da Academia Goiana de Letras, Academia Goiana de Medicina, Instituto Histórico e Geográfico de Goiás)