DO ANTES E DO AGORA
Diário da Manhã
Publicado em 16 de maio de 2016 às 21:33 | Atualizado há 3 meses
Erico Curado formou-se em Direito. Foi poeta, escritor, jornalista, advogado e promotor público na Cidade de Goiás. Escreveu para vários jornais de Anápolis e da Cidade de Goiás. Seu primeiro livro Illvminvras (1913). Sua produção literária apresentava características de “nefelibatismo”, em que privilegia o conteúdo mais que a forma. Teve participação ativa no Congresso Nacional de Intelectuais, realizado em Goiânia, em 1953. Pertenceu à Academia Goiana de Letras, (Posse – 29/09/1957). Seu segundo livro Poesias (1956), considerado a maior expressão da corrente simbolista em Goiás, recebeu, em 1957, o Prêmio Bolsa de Publicação Hugo de Carvalho Ramos. É pai do escritor Bernardo Élis.
Erico Curado
Marli Gonçalves de Assis é formada em Artes Visuais e Artes Plásticas, com habilitação em pintura e gravura, pela Universidade Federal de Goiás – UFG. Foi professora da Universidade Estadual de Goiás – UEG, na cidade de Silvânia, onde reside. É professora no Centro Livre de Artes – CLA da Secretaria Municipal de Cultura, órgão da Prefeitura de Goiânia, há mais de 30 anos. No CLA, foi, durante muito tempo, coordenadora do curso de Artes Plásticas. Promove e participa, junto aos alunos, de exposições e mostras de pinturas e desenhos.
Marli Gonçalves de Assis
Poemas do escritor Erico José Curado (Pirenópolis-GO, 18/05/1880. Goiânia-GO, 11/01/1961). Telas da artista plástica Marli Gonçalves de Assis (Anápolis – GO)
INDA HOJE ME RECORDO
Inda hoje me recordo com saudade,
Ao rever essa casa em que habitamos,
Das carícias, da terna suavidade
Da tua voz, o os beijos que trocamos.
Que ternura de abril, que suavidade!
Azul de céu, trilhar de gaturamos…
E os soluços, – enchendo a imensidade
Da voz do campanário, onde rezamos…
E me lembro da alcova em que, assentados,
A cismar, eu e tu, no mesmo leito,
Eu mordia-te os lábios perfumados.
Foi um hino de luz o nosso amor…
Hoje, morto, em saudades já desfeito:
– Doce aroma sutil – de extinta flor.
AO ESPLENDOR DAS MANHÃS
Ao esplendor das manhãs, silencioso e contrito,
Como é belo e sublime – olhar-se a natureza:
Sentir-se dentro d’alma esse afago bendito
Que em perfume conduz de devesa em devesa!
Ver-se um céu sempre azul, perder-se no infinito,
E das aves ouvir-se um hino de pureza,
E o rumor da floresta e dos montes o grito,
Num concerto divino à suprema beleza…
E, além, o vale imenso e o rio que, disforme,
Das brumas vai seguindo o branco vulto enorme!
Desatam-se em perfume os brancos laranjais…
E o gado vem descendo em procura de aprisco,
Abre-se então o sol, em fogo, o flavo disco,
E, aqui e ali, se exalça a alvura dos casais…
SONETO
Gusla maviosa – ou trêmulos violinos…
Luas de Maio, ó brisas vesperais,
Olhos que exalam sonhos levantinos,
Linhas quebrando em formas imortais!
Sinfonias da Luz, nênias dos sinos,
Lendas e sagas, noites medievais,
Lírios e rosas, níveos, purpurinos,
Fazei meus versos vagos, musicais!…
Fazei meus versos de um lavor sutil…
Rimas brilhando em cadencioso aceno,
– Murmúrio esparso de um rosal de Abril!
Fazei meus versos leves, como um trilo,
Como o sorrir de um bandolim sereno:
– Salmos de amor, – em blandicioso estilo!…
CHEGA RISONHA, LÂNGUIDA
Chega risonha, lânguida, cansada,
Ascende um cheiro tépido de rosas…
E erra na alcova agora iluminada,
Um suspiro de rendas vaporosas.
E assim risonha, tímida e assustada,
Deixa cair as vestes perfumosas…
E alva e excelsa de beijos circundada,
Tremem-lhe as formas lúbricas, nervosas!
E nua a espádua que de amor rescende
O ventre e os seios a ascender desejos
Sorrindo, as tranças, tremula desprende…
E a cabeleira que o seu corpo inunda,
– como uma noite tropical, profunda,
Veste-a de um manto rútilo de beijos.
QUANDO TU CANTAS
Quando tu cantas nessa voz dolente,
Queixosa e amarga, – voz das elegias…
Quando tu cantas, minha alma de crente,
Benta na unção das velhas liturgias,
Parece que se evola brandamente,
Para as regiões da luz, das harmonias;
E, comovida e terna e reverente,
Fica absorta n’um sonho de magias…
Tarde. – Angelizam-se do poente as cores,
Sobe da Terra um salmo de amargores
E a noite cai povoada de fatigas…
Ah! Canta nessa voz abemolada,
– De dores, de saudades repassadas,
Cheia das mágoas das canções.
À TARDE, NUVENS DE ROSAS
À tarde, nuvens de rosas
Franjam de sangue o horizonte,
Um monte além outro monte,
Entre sombras misteriosas.
As águas cantam ruidosas,
Luzindo à sombra da ponte.
São frescas águas da fonte,
Que vão cantando saudosas…
Em bandos passam morcegos,
As rãs coaxam nos regos
Geme o vento em disparada…
E entre as estrelas, no poente,
O arco-de-ouro do Crescente
É uma foice ensanguentada!
A página Oficina Poética, criada e organizada pela escritora e acadêmica Elizabeth Abreu Caldeira Brito, é publicada aos domingos no Diário da Manhã. Esta é a 221ª edição (desde 08/01/2012). [email protected]