Educação, democracia e cultura de parceria
Diário da Manhã
Publicado em 4 de março de 2016 às 01:17 | Atualizado há 9 anosTive a oportunidade, em 1990, de trabalhar como professora de História e de Geografia, no Col. José de Assis, do Estado de Goiás.
Oportunidade inusitada. Eu era estudante de Serviço Social. Procurava trabalho e frequentava a Assembleia Legislativa, bem como a Câmara de Vereadores. Tendo encontrado um conhecido no gabinete do então deputado Moura, tal conhecido, que era professor, na época, estava desesperado diante do fato de que não poderia assumir alguma de suas turmas escolares, que haviam lhe sido “devolvidas”, por questões pessoais, pelo amigo que estava responsável pelas mesmas, já que estava impossibilitado de lecionar, naquele momento. Eram várias turmas, meses sem aulas e diários atrasados e em branco.
Assumi tais turmas, em horário noturno. Fui muito feliz, nesta oportunidade de trabalho, e muito agradeço, por ela.
Quando cheguei na turma, havia guerra de bolachas entre os alunos mais animados e enorme descrença e tristeza, no restante. Muita revolta, no geral. Aos poucos, o ambiente mudou; coloquei os diários em dia; o alunado ficou amistoso, interessado e produtivo.
Lembro-me de uma noite em que conseguimos autorização para darmos a volta no quarteirão da escola, em uma aula prática de Geografia, quando pudemos avistar constelações, localizar os pontos cardeais e caracterizar as estações, em um exercício de “aonde estou”?
Conversávamos sobre livros, filmes e documentários, nas aulas de História. Quase nunca eu passava todo o recreio na sala dos professores. Sempre ia ao pátio, para uma prosa com o alunado. Era lindo.
Porém, certa vez, na Sala dos Professores, entusiasmadíssima, cheguei empolgada em um professor que se arrastava da mesa para o armário. Nunca me esqueci disto, pois tal professor era das lutas sindicais por uma sociedade justa e fraterna. Ele era muitíssimo descrente com o sistema educacional e representava a metade do professorado daquela escola. Eram revoltados, quase que na totalidade; alguns poucos, mais joviais, pelejavam, como eu, para manter e disseminar a boa vontade, a fé e a esperança.
Pois bem. Tal professor, ao me ver tentando contagiá-lo para um movimento positivo na escola, disse: “Me esforçar para este governo que está aí, não dá!” Na hora, não entendi o discurso, apenas percebi nele, uma amargura recalcitrante, comum ao meio. Passou-se muito tempo, para vir o entendimento.
Neste momento, em que assisto o movimento contra as OS’s, penso a Educação.
Penso a Educação há décadas e já publiquei artigos sobre este tema. Estão em meu blog.
Não sou a favor das OS’s. Já falei sobre a ongarização dos direitos, as escolas militares e o chamado sistema “S”, em outros momentos. Agora, me ocupa, a Educação.
Estou por entender que neste século XXI, Estado e população se digladiem, na luta pela Educação.
Neste momento de conturbações terríveis, no cenário político brasileiro, podemos constatar desmandos, falcatruas e mau-caratismo em todos os campos dos poderes constituídos, como já constatávamos, nos diversos outros setores da sociedade.
Causa-me espécie ver, ainda nestes tempos, com tanta informação, alguns grupos e pessoas que se arvoram na desconstrução dos outros, como vestais, na construção da nova sociedade que todos os segmentos preconizam, na retórica.
Penso as práticas.
Outro dia, conversava com minha filha Olga, sobre os povos que como não sabiam conversar, e diante de outros, tidos como rivais ou inimigos, chegavam brigando, quebrando e matando.
É muito primitivo o modo como vem se apresentando o movimento contra as OS’s, em Goiás. E clamam diálogo. Em um momento, propõem isto, buscam cartas de apoio; em outro momento, promovem badernas, poluição ambiental, achincalhamentos. Às vezes, no mesmo momento. Dizem que a Seduce não quer dialogar, mas vociferam que não darão “arrego” e não aceitarão as OS’s. Não aceitam que a época de discutir o que fazer, foi a da construção do Plano de Governo registrado em cartório. E tome piadas, chacotas e outras imbecilidades que só não são estéreis na luta por uma sociedade justa e fraterna, devido o fato de que minam a vontade e a fé, nesta possibilidade… Barbárie.
Quase nunca algum membro deste movimento esteve em outras lutas, pela Educação ou em suas comunidades, pelos conselhos tutelares, contra a violência doméstica, a homofobia, o feminicídio, a carestia, a inflação, a segurança, a saúde, os serviços públicos de limpeza da cidade, o esporte, o lazer ou outro Direito constituído, a não ser aqueles que estão ligados a algum partido político, que, vale lembrar, perdeu a eleição. E todos fazem olhos cegos e ouvidos moucos, aos desvarios de seus aliados.
Fico enojada de ver como alguns ainda se machucam nas trincheiras, enquanto aceitam ser massa de manobra de outros, que quando não mais precisam, descartam os que já se machucaram tentando garantir ideias que pensavam ser comuns. Fogueira de vaidades.
São muitas, as segmentações, na luta por uma sociedade melhor e eu luto contra isto, devido a pulverização dos recursos e a alienação, quanto à totalidade dos fenômenos sociais. Mas a Educação, mais do que qualquer outro segmento, tem que conhecer, reconhecer e participar de todas as lutas. Infelizmente, uma parte do professorado prefere ignorar as questões políticas; outra parte se diverte, sempre maldizendo, e outra parte é partidarista, ligada a algum grupo de interesses políticos, eleitoreiros. E grande parte dos alunos, mal estuda o que o professorado “manda”, em sala de aula.
Nas escolas ocupadas, prejuízos foram contabilizados. O Movimento contra as OS’s não considerou que as escolas são um bem público, patrimônio coletivo; se sentiu dono. Muito mal educadas, as pessoas deste movimento. Exemplos de que como está a Educação, não dá. Falta gestão e sobra politicagem. Desrespeitaram o Estado, não o governo. Vandalizaram.
E são vitimistas. Reclamam de cortes de água e energia elétrica durante as ocupações e da violência policial; desta, eu também reclamo. Mas ignoraram que para cada ação, uma reação. O Estado deveria ter mantido esses cortes, pois talvez tivesse evitado a delonga das ocupações. Não é a maioria do professorado e nem da população que está contra as OS’s; nem as famílias dos educandos. Querem brigar com o governo de forma violenta e serem acatados e patrocinados pelo Estado? Não dá para respeitar esta luta como tem sido, ainda que seja legítima.
O fato é que as OS’s estavam previstas no Plano de Governo do atual governador. Plano eleito nos dois últimos pleitos, embora a oposição insista em negar, enquanto pede para que se deixe a Presidenta Dilma governar, em ilação ao 3º turno, para o Governo Federal.
Por outro lado, também é fato a insatisfação, de toda a sociedade, com o modelo educacional vigente em nosso sistema público, que é ineficiente e nada atrativo, para educadores e educandos. A descrença é geral, há décadas. O nosso sistema de Educação, no geral, não educa, não socializa, não promove o desenvolvimento de habilidades, de conhecimentos gerais, do português, da redação, da leitura, da matemática.
Inaceitável que a luta pela Educação, neste milênio, passe pelo que aconteceu na UFG/Faculdade de Educação, quando o alunado e manifestantes, junto a um Professor/Mestre, receberam, para um debate, a Secretária de Educação, com vaias e xingamentos; uma luta que, nas escolas ocupadas, impediu a mesma Secretária, de entrar e impossibilitou o debate produtivo.
Quanto à qualidade dos serviços que serão prestados, à idoneidade dos processos, ao compromisso das OS’s com a Educação Pública de qualidade, é outra estória. Tudo isto tem que ser acompanhado e garantido. O MP/GO tem tido voz coerente, nesta questão, apesar da politicagem, ao redor.
Desejo sucesso à Seduce e ao governo de Goiás. E às OS’s, na missão de elevarem a qualidade do ensino público em nosso Estado. Parabenizo a Profª Raquel Teixeira pela força, resistência e determinação.
(Alexandra Machado Costa, assistente social, poetisa, servidora pública concursada e dirigente sindical)