Ilusões
Diário da Manhã
Publicado em 12 de novembro de 2016 às 01:48 | Atualizado há 8 anos“…a ilusão é o sorriso de Deus…”– Srimad bhagavatam Devaneios, pensamentos, um mundo a parte construído por nosso imaginário. Um dia sentado no quarto vamos a milhares de pontos do universo reconstruindo cenas, diálogos, situações. Na cabeça, em nosso pensamento, não existe presente, passado ou futuro apenas ideias que se vão e vem por ai a algum lugar. Vivendo coisas, lembrando e ou dando outra forma para o que não aconteceu… jurando que um dia aquilo que se imaginou existiu.
Mas o que é viver neste mundo a parte da realidade? Por que fantasiamos e vivemos neste cenário do imaginário que nos povoa em pensamentos?
Ha algum tempo uma paciente queixou se por que se via em um embate com seu filho falecido. O rapaz havia morrido ha mais de dois anos em um acidente de moto. Ela em vários momentos se percebia sentada sozinha em seu quarto discutindo com seus pensamentos, sofrendo, irritada, dialogando com suas ideias, repassando situações e pontos de vista, nas várias cenas do destino que em passado povoavam sua cabeça… as expressões: “Se”, “acho”, “talvez” e um oceano de divagações e diálogos a povoavam por horas, semanas em um desconforto de viver pela metade, separada de si mesma em suas ideias…em um mundo estranho dentro de si mesma… mas por que fazemos isto com nossa existência? Por que construímos mundos, situações, pessoas? Por que a fantasia nos povoa e nos iludimos?
a ilusão faz parte do mercado de consumo, abastece o desejo, a identidade pós-moderna, as ideologias, os conflitos na disputa de poder, a insatisfação, a construção arquetípica da Sombra na pós modernidade que aliada ao aspecto negativo da Anima/Animus pode alimentar um Complexo, uma forte neurose, retirando uma pessoa de sua identidade, vida, produção, a transformando em um alienígena e prisioneiro de si próprio. Em uma construção comunicativa e ideológica na qual se iludir faz parte de uma realidade virtual, religiosa, socialmente aceita e venerável em que mundos paralelos são reconfigurados, na construção antropológica de símbolos noturnos dentro do imaginário coletivo. Todos neste mundo temos ilusões só que é patológico viver preso a elas, ou pior ainda sofrer por suas consequências… ou como no citado por Marguerite Duras:
“Há ilusões que se parecem com a luz do dia; quando acabam, tudo com elas desapareceu…”
Quais ilusões você alimenta diariamente? De status? Poder? Relacionamento? De sua própria identidade? De amores ou inimigos imaginários? Passado, presente ou futuro? Quem povoa seus pensamentos?
Qual é o tamanho de seu investimento neste mundo criado por suas ideias?
Quantas horas gasta, quanto tempo dedica para se pensar em seu mundo criado? a mente humana tem esta graça guiada por nosso instinto criativo, recontamos para nós mesmos histórias, fatos, a vida e ali podemos habitar sentados filosofando sobre uma pedra “existindo” enquanto o rio da existência passa. Fernando Pessoa no Livro do Desassossego pontua:
“…Saber não ter ilusões é absolutamente necessário para se poder ter sonhos…” mas você esta pronto para isto?
(Jorge Antonio Monteiro de Lima, analista, pesquisador em saúde mental, psicólogo)