Pedantismo agarrado ao Vade Mecum
Diário da Manhã
Publicado em 16 de abril de 2016 às 02:21 | Atualizado há 9 anos
Na última terça-feira, 13, neste espaço foi publicado texto sobre a eleição do Centro Acadêmico de Direto da PUC (CACB). O autor do artigo, Heitor Soares, mostra despreparo ao debate. Primeiro: não relacionei seu nome ao de Ronaldo Caiado. Fiz, apenas, um recorte do acontecimento que ocorrera na instituição, relacionando-o ao contexto político que vivemos. Segundo: Heitor Soares acredita ser intocável. E, também, o patrono da moralidade. Afirma que meu texto é cheio de contradições, por, simplesmente, relacionar um fato ao outro – prática comum no jornalismo. Com escreveu Bertold Brecht: “nada é mais parecido com um fascista do que um burguês assustado.”
Pois bem. Heitor Soares é incoerente. Agride o léxico do vernáculo, sem piedade. Até as vírgulas foram posicionadas indevidamente, em seu texto. Rotula-se conhecedor da comunicação social e da história do Brasil, mas é incapaz de entender a subjetividade humana e o contexto em que vive. Ele, certamente, deve jorrar os velhos chavões reacionários – que estão impregnados no Campus V da PUC – na mesa do bar, no final de semana. “Não sou de fugir do debate”, diz no texto. Bem, com toda sua sapiência intelectual, ele já ouvira, alguma vez, a frase célebre frase de Voltaire: “Posso não concordar com nenhuma de suas palavras, mas defender-lhe-ei até a morte seu direito de dizê-las.”
A democracia sustenta-se com o livre debate de ideias, com o contraditório. E o bom jornalismo segue este preceito. No entanto, usar de discurso elitista atrás da veste democrática, definitivamente, não é honestidade. Kim Kataguri, líder do MBL (Movimento Brasil Livre), fez, praticamente, a mesma coisa, no último final de semana. Em debate promovido pela TV Folha, o menino destilou toda sua ‘fúria’. Classificou a UNE (União Nacional dos Estudantes) como uma organização comunista e afirmou que “as escolas públicas são escola para o tráfico”. Heitor seguiu mais ou menos pelo mesmo caminho. “A situação de chapa única se deu pelo fato de que a outra chapa – composta majoritariamente por estudantes ligados ao Partido dos Trabalhadores – não conseguiu cumprir os requisitos básicos e documentais previstos no regimento interno”, alardeou.
No sétimo parágrafo, do segundo entretítulo, Heitor disse que usei indevidamente o termo “Casa Grande e Senzala”. Para ele, a “referência a Casa Grande e Senzala, que retrata um período brasileiro que definitivamente não representa e sequer pode ser comparado as picuinhas geradas por essas grupos estudantis que defendem os interesses de seus partidos e não são preparados para debater no campos das ideias”. Ora, meu nobre Heitor, eu apenas digo-lhe: ao fazer uso do termo “Casa Grande e Senzala”, parafraseei Gilberto Freyre, um dos maiores intelectuais brasileiros de todos os tempos. Ou seja, defendi uma ideia. Já que intitula-se sábio e dono do conhecimento, deve saber da análise do professor Gilberto Freyre sobre a patriarcal sociedade brasileira.
Aluno do antropólogo Franz Boas, nos EUA, na década de 1930, Freyre desenvolveu estudo sobre a formação da sociedade brasileira. A obra é divida em vários capítulos. No primeiro, Freyre fala sobre as características da colonização portuguesa. Já no segundo capítulo, por sua vez, ele aborda a temática e o mito do índio preguiçoso. O terceiro capítulo é sobre o colonizador português. E, por fim, no quarto e quinto ele discorre sobre negro na vida sexual e de família do brasileiro. É só ligar os fatos, caro Heitor. Ah, recomendo-lhe outra obra: As raízes do Brasil, do historiador Sérgio Buarque de Holanda. E, se tiver curiosidade, dê uma lida em Viva o povo brasileiro, do mestre Darcy Ribeiro. Talvez mude o pensamento.
Não deixe de lado, também, a poesia. Sinto que ela está em falta em você. Ao redigir minha reportagem, foquei no lado subjetivo do fato. Tenho como mestre e norte em minha profissão gente como Hunter Thompson, Tom Wolfe e Gay Talase. E na literatura, Balzac, Dickens, Tolstoi, Dostoievski, Henry Miller, Mário de Andrade, Nelson Rodrigues e outros. Eles ensinaram-me sobre a natureza humana. Coisa que, evidentemente, não faz-lhe o tipo. Eu observo, não faço julgamento. Eu relaciono, não tiro conclusões. Eu interpreto, não agrido. Eu tento exercer o jornalismo, profissão importantíssima à democracia, com um mínimo de dignidade.
Não tenho filiação partidária. Acredito que a revolução parte da alma ao social. Sou Existencialista. Não prendo-me aos chavões da direta, nem da esquerda convencional. Sou da geração do amor, mesmo ela sendo uma utopia dos anos 60. Sou um estudante de Jornalismo, que pensa que figuras de linguagem não são muito bem compreendidas. Alardeou, bradou, reverberou, afirmou, mas não entendeu. Evite o achismo, Heitor. Uma boa reportagem nasce do olhar e sensibilidade do repórter, junto à interpretação e garimpagem dos fatos.
Teu colega de curso, cujo nome não lembro-me, ameaçou, sim, Maria Luíza. Apontou o dedo em riste, em direção à face dela. E isso é democracia? Isso é o debate de ideias que defende? Isso é ser zelador dos ‘bons costumes’? Este teu discurso, Heitor, é raso e simplista. Este teu discurso é o que vemos todos os dias na grande mídia. Este teu discurso é perigoso e preguiçoso. Este teu discurso justificara tragédias ao longo História. Este teu discurso é o mesmo dos que se dizem defensor da democracia, mas que vão às ruas, como massa de manobra, pedir a volta da barbárie, da truculência, do militarismo retrógrado, arcaico e fascista.
Estou perplexo. Frequentar o ambiente acadêmico, e mostrar a incapacidade de interpretar um texto, incomoda-me. Mostrar a falta de compaixão intelectual e linguística, assusta-me. Mostrar a falta de bom-senso, enfada-me. Mostrar a falta de leitura, choca-me. Mostrar a falta de sensibilidade, tortura-me. Ligar-me ao PT, por conta de uma opinião expressa numa matéria, indigna-me. Isso é honestidade? Teu texto é profundo como o chão do bloco A do Campus V, Heitor. Teu texto, meu caro, é furioso, é rancoroso, é chulo, é reacionário, é, por vezes, confuso.
Os estudantes de jornalismo e jornalistas têm convicção de que quando uma imagem é publicada, ela passa a ser domínio público. E ela fora publicada, no grupo do Direito, que faço parte nas redes sociais.
Com disse Sócrates, na acrópole: “Só sei que nada sei”.
(Marcus Vinícius Beck, estudante de Jornalismo e corintiano)