Superstições fazem parte do dia a dia
Diário da Manhã
Publicado em 25 de janeiro de 2018 às 00:02 | Atualizado há 7 anosSuperstições fazem parte do dia a dia de todo mundo. E como sempre dou um curioso pesquisador de tudo, fui atrás das origens folclóricas e históricas das principais. Superstições, e creio que todos também gostariam de saber como surgiram ou por que todo mundo tem a sua.
Uma rápida pesquisa nos leva a descobrir a razão de tantas superstições corriqueiras no dia-a-dia.
Há duas formas de superstições: de sorte e de azar.
Todo mundo acha que ter uma ferradura dependurada na parede sobre a porta de entrada traz sorte. De acordo com a lenda de São Dunstan, ferreiro inglês da Idade Média, que viveu no Século X, ele recebeu a visita de um homem que lhe pediu que colocasse ferraduras em seus próprios pés, supostamente cascos fendidos. Dunstan teria reconhecido rapidamente seu freguês como o diabo e explicou-lhe que, para executar o serviço, teria que algemá-lo à parede. O ferreiro fez com que o serviço fosse tão demorado e doloroso (tornando-se uma tortura enorme) que o diabo pediu clemência para parar com isso. Dunstan só o soltou depois que ele jurou nunca mais entrar em uma casa que apresentasse uma ferradura acima da porta. Mas a ferradura tem que ser pregada com a abertura para cima, para que a sorte não “derrame”.
Dizem que cruzar os dedos é de certa forma um pedido de sorte, quando se pretende realizar um negócio ou esperar um resultado bom. Isto vem da Antiguidade, nos primeiros anos do Cristianismo. Em lugares e épocas nas quais ser cristão era perigoso, como no Império Romano, cruzar os dedos era uma forma de fazer referência à cruz e pedir a proteção de Jesus Cristo sem ser notado. Pouco a pouco, o sentido religioso se perdeu e o gesto passou a ser interpretado simplesmente como um pedido de boa sorte.
Outra coisa muito comum é dizer que se a gente portar um trevo de quatro folhas traz sorte. De acordo com uma lenda cristã, quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, Eva trouxe consigo um desses trevos. Por ser um pedaço do paraíso, ele é um símbolo positivo e que traz sorte para quem o encontra. Segundo os druidas (sacerdotes celtas), quem tivesse um trevo de quatro folhas poderia enxergar os demônios e, assim, escapar deles. São Patrício, nascido na Irlanda no Século IV, usava um trevo para explicar a Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo). Alguns fiéis passaram a ver a eventual quarta folha como mais um elemento, a “Graça de Deus”, ou seja, o símbolo da sorte.
Outro símbolo de sorte, conhecido praticamente no mundo inteiro, é o pé de coelho, que vem de uma forma tradicional de magia popular afro-americana praticada nas Américas, mas que nasceu nos Estados Unidos chamada hoodoo, criada pelos negros norte-americanos. Um de seus amuletos mágicos é justamente o pé de coelho. Mas não qualquer um: somente o pé esquerdo de um coelho morto com um tiro ou em um cemitério serviria. Se a morte dele ocorrer em cima de uma tumba, em noite de lua cheia ou numa sexta-feira 13, melhor. Não é qualquer pé de coelho que traria sorte, mas aquele designado pelos seguidores do hoodoo.
Um símbolo tradicional da sorte é a figa, representado por uma mãozinha fechada, que as mães amarravam no pulso dos recém-nascidos para afastar doenças e maus presságios. Era um amuleto comum na Grécia e na Roma antiga, principalmente entre as mulheres, por ser considerado um símbolo de fertilidade: o polegar entre os dedos representa o órgão masculino penetrando no feminino. Com o tempo, o símbolo perdeu a conotação sexual.
Por outro lado, há também as superstições de azar, como derrubar sal. Se alguém deixava derramar sal, era mau presságio. Acontece que antes da existência das geladeiras, a única maneira de preservar alimentos perecíveis era salgando-os. Porém, na antiguidade o sal era muito raro, tanto que os pagamentos naquela época eram feitos com sal, dando origem à palavra “salário”; como o sal era muito caro, desperdiçá-lo significava prejuízo na certa. Para aumentar o cuidado das pessoas, passou-se a dizer que derrubar sal dava azar. O mito se reforçou graças ao pintor Leonardo da Vinci, que retratou um saleiro caído em frente a Judas no quadro “A Última Ceia”.
Diz-se também que passar debaixo de uma escada dá azar, esteja ela apoiada em uma parede ou aberta, a escada acaba formando um triângulo, um dos símbolos da Santíssima Trindade. Passar pelo centro dele, então, representaria uma ameaça ao equilíbrio entre Pai, Filho e Espírito Santo e, consequentemente, um pecado. Por isso, virou sinônimo de má sorte. Não é apenas a Igreja Católica que dá uma interpretação peculiar ao triângulo: os antigos egípcios diziam que ele é o símbolo da vida, e inclusive na maçonaria seu simbolismo é muito grande.
Uma superstição muito nova é a de se dizer que deixar o chinelo virado causa a morte da mãe. Esta história está relacionada à moda dos chinelos no Brasil nos anos 60. Como muitas casas ainda não tinham acabamento no chão, os calçados ficavam mais sujos se estivessem com a sola para cima. Daí essa falsa maldição, que tinha como objetivo fazer os filhos não largarem os calçados de qualquer jeito.
Sempre se diz que quebrar espelho dá sete anos de azar. A adivinhação por meio de reflexos na água (catoptromancia) era muito popular na Antiguidade. Porém, se o recipiente que continha a água caísse e quebrasse, que causasse a quebra teria maus bocados pela frente. Os romanos diziam que dava sete anos de azar porque, segundo uma teoria da época, o corpo de um homem se renovava completamente ao longo de sete anos.
O noivo ver a noiva com o vestido antes do casamento dá azar, é o que se diz. Durante boa parte da nossa história, o casamento foi uma relação comercial. Por receio de que o noivo não gostasse da futura esposa e desistisse, a família da menina a escondia até a hora da cerimônia, sob a desculpa de que vê-la antes traria azar.
Gato preto sempre foi símbolo de azar, porque Na Idade Média, eles foram associados às bruxas devido aos seus hábitos noturnos. O papa Inocêncio VIII chegou a incluir os felinos dessa cor na lista dos perseguidos pela Igreja Católica pela Inquisição. Para piorar, em 1561 o autor inglês William Baldwin escreveu um trabalho satírico chamado “Beware the Cat” (“Cuidado com o gato”), no qual os gatos pretos eram, na verdade, bruxas disfarçadas que tinham nove vidas, ajudando a espalhar ainda mais a lenda. Devido às superstições, gatos pretos são menos adotados de abrigos – há até estudos comprovando isso.
Dizem que abrir guarda-chuva dentro de casa traz má sorte. Os guarda-chuvas só se tornaram um item usado em larga escala na Inglaterra da Era Vitoriana (século XVIII). Essas primeiras sombrinhas tinham um mecanismo feito de metal que podia causar ferimentos sérios se atingisse alguém. Para evitar acidentes, as pessoas passaram a falar em azar para quem abrisse guarda-chuva em ambientes fechados.
O número 13 sempre foi o símbolo do azar. A origem é da civilização nórdica: revoltada por ter perdido espaço para o cristianismo, a deusa nórdica do amor e da beleza, Friga, teria se exilado no alto de uma montanha onde, às sextas-feiras, se reuniria com 11 feiticeiras e com o próprio diabo (total: 13 pessoas) para praguejar contra a humanidade. E o fato de sexta-feira 13 ser aziago, deve-se ao fato de que na Última Ceia, Jesus Cristo convidou seus 12 apóstolos para jantar, totalizando 13 pessoas.
Além disso, Jesus foi crucificado justamente em uma sexta-feira.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa – AGI e da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas – Abracri, escritor, jurista, historiador e advogado – liberatopo[email protected])