Tradição e resgate na origem da cidade
Diário da Manhã
Publicado em 1 de março de 2017 às 00:47 | Atualizado há 8 anos
São 79 anos como cidade, 102 como Vila e Município e 73, Comarca. Nos anos de 1873/1880, o local onde hoje está a cidade, não passava de uma desértica região do Sudoeste Goiano. Conforme tenho dito e comprovado na crônica historiográfica, dentre outras fontes, os Carrijo de Rezende, com outras poucas famílias, são os principais fundadores do lugar. Coronel Joaquim Carrijo de Rezende, Elias Carrijo de Rezende, José Carrijo de Rezende, Caetano Carrijo de Rezende e Francisco Carrijo de Rezende. Suas irmãs, Flávia Fernandes de Rezende, que se casou com José Alves Rodrigues; Zita Fernandes de Rezende, casada com Francisco Carrijo da Cunha; Maria Luíza de Rezende, que se casou com Manoel Alves de Rezende, apelido “seu Neca” e Carolina Fernandes de Rezende, casada com o primo, Elias de Rezende, o “Elias Grande”. O Coronel Carrijo nasceu em 26 de junho de 1852, no Distrito de Bagagem, Rocinha, região do Prata, Minas Gerais, no Triângulo Mineiro, velho Sertão da Farinha Podre.
Há algumas curiosidades históricas ainda a ser desvendadas. Os Carrijo de Rezende, para essa heróica viagem com seus negros escravos, Cristino, Sebastiana, Bernardino e Mariana, em carro de boi, a pé ou a cavalo, teriam sido orientados e usado a “Picada” feita pela turma chefiada e “orientada” por Alfredo d’Escragnolle Taunay ou propriamente Visconde de Taunay, na sua épica viagem chamada Retirada da Laguna, com destino à Guerra do Paraguai, imortalizada no romance histórico homônimo (1871). Sabemos que os Carrijo aproveitaram dessa “picada” até as Abóboras, então chamada “Dores do Rio Verde”, ora a pujante cidade de Rio Verde, não fazendo nenhuma referência em seu livro a Mineiros, obviamente, nem a Jataí, “Cidade do Mel”. Segundo o cronista Salazar Pessoa Filho, através do livro: “Uberabinha versus Uberlândia” (1968). Entre os fazendeiros de Minas Gerais que acompanharam a expedição militar dirigida por Visconde de Taunay, “esteve o jovem Joaquim Carrijo, filho de Felisberto Alves Carrijo, o principal fundador de Uberlândia, e após sua morte, levando com ele vários parentes, os Rezende, os Peixoto, já entrelaçados em família”. Fato que, certamente, comprovaria que o coronel Carrijo, ainda bem jovem, fez parte de caravana destinada à Guerra do Paraguai, denominada “Voluntários da Pátria”.
Creio haver uma dúvida quanto ao nome do pai do coronel Joaquim Carrijo que, segundo o livro de registro e memória “Família Mundinho”, responsabilidade da mesma, datilografado em 1995, o referido coronel é filho de Marcelino e Genoveva Fernandes Resende. Nasceu em 25 de junho de 1852, em Rocinha, Distrito de Uberaba, hoje, Estrela do Sul. Faleceu em 8 de novembro de 1925, em Mineiros, onde foi enterrado no Cemitério então chamado “Secular”, local no qual permanece “o mesmo rústico túmulo daquele tempo”. Sua esposa, Donaciana Alves de Rezende, parente próxima, presa às tradições, costumes e ao habitual recato da família, em especial da mulher de origem mineira, vaidosa, discreta, faleceu treze anos depois, em 9 de setembro de 1938, na mesma casa de nº 13, de triste passamento do coronel, na Praça do seu nome, ainda existente na forte tradição da família, ali residindo a única neta ainda viva do coronel, Eudóxia Francisca de Rezende Cunha, com mais de 90 anos, na saudosa viuvez de Paulo Borges Cunha.
Os Carrijo apossaram-se de grande área de terras devolutas, assim como parte vinda da família Vilela, predominante em Jataí, ao lado de outros abnegados pioneiros. Pararam a 6 quilômetros do Rio Verde, carinhosamente apelidado Verdinho, no local que chamaram de “Ressaca”, já então na Fazenda Flores do Rio Verde, na qual se encontra todo perímetro urbano e suburbano da cidade, já vislumbrando os primeiros vestígios do fenômeno chamado rururbanismo, criação do sociólogo Charles J. Galin. Algum tempo depois deixaram a “Ressaca”. Buscaram a vertente de um Corguinho que, segundo ensina a tradição, já estava “João Mineiro”, não se sabe se fugido de alguma trapaça ou por outro motivo, sendo certo que já é até personagem de uma peça de teatro, autoria de José Leão Souza, rememorando a fundação do lugar na própria transcrição do “córrego do Mineiro”, imortalizado como o atual córrego Mineiros, tudo ainda caracterizando e evidenciando a cidade com origem num “2º Distrito de Jataí”, derivando outros nomes como “Arraial do Mineiro”, “Igreja do Mineiro” e outros que registro na construção, descrição e narração dessa história que, por ilusória ou utópica que seja, está fundada em três teorias, dentre outros fatores: a de um sitiante de nome João Mineiro; a causada por um boi carreiro, manhoso, chamado Mineiro; a causada pelo costume dos moradores da redondeza, ao prosear pelos caminhos bucólicos, “vamos lá nos mineiro”, ainda do tempo em que se suprimia letras, às vezes sílabas, característica desse povo das Minas Gerais.
Além das míticas ou lendárias teorias descritas, em razão de localização no extremo sudoeste goiano, sempre distante da Capital; ser o Estado de Goiás um dos últimos no país a sair do isolamento, sobretudo geográfico, já se urbanizando e civilizando-se por toda parte (urbi et orbi), ou clamando por toda a parte, Mineiros tornou-se um lugar dos mais isolados do Centro-Oeste, imaginem do Brasil, sujeitando-se, portanto, para ser o que sonha e consegue ser, a vários fatores, exógenos e endógenos, que traduzo em três: fator de ordem geográfica, que considero “natural”, gerador de forte isolamento pela absoluta falta de meios de comunicação, tornando o lugar no “meio do nada”, por longo período uma cidade, a bem dizer, do “vai quem quer”, na qual o povo uniu-se, sobremaneira, pelo casamento em uma mesma árvore genealógica (endogamia), só excepcionalmente pelos ajuntamentos do sexo oposto sob a influência do impulso sexual; o segundo fator é de ordem administrativa. A falta de apoio oficial até meados de 1965. A forte oposição entre partidos políticos aqui reinantes, deixando incríveis rixas, brigas e até morte nos períodos eleitorais, sequestro de promotor e outros fatos e atos ilícitos característicos da velha política do tempo dos coronéis; e o terceiro fator, acredito gerado em consequência do que ocorreu entre os dois primeiros, é de ordem subjetiva ou psicológica, que chamo princípio da hospitalidade, talvez o mais importante na história das sociedades humanas, tornando Mineiros uma cidade empreendedora e com forte espírito de comunidade, como são vários os exemplos, destacados pela construção de hospitais, escolas, bancos, academia de letras etc., sendo por isso, certamente, que Mineiros nunca recebeu o pejorativo apelido de “Obvlion ou Itaoca” de “Cidades Mortas”, debochada criação literária do contista Monteiro Lobato.
Deixo de colocar neste capítulo a Bandeira Municipal, com sua tradição portuguesa, o Escudo ou Brasão do Município, criação da professora Marli Ramos, o Hino Oficial de Mineiros, autoria do músico e cantor Rildo Rodrigues de Oliveira, dentre outros emblemáticos símbolos dos nossos sentimentos de pertencimento, por estarem transcritos no livro Parque das Emas: última pátria do cerrado bioma ameaçado, 3ª edição (2011).
(Martiniano J. Silva, advogado, escritor, membro do Movimento Negro Unificado (MNU), da Academia Goiana de Letras e Mineirense de Letras e Artes, IHGGO, UBEGO, Mestre em História Social pela UFG, professor universitário, articulista do DM ([email protected]))