Desde que ingressou no Ministério Público Federal, em 1996, o procurador Mário Lúcio Avelar deixou claro que não estava apenas de passagens pela instituição, um dos espaços mais influentes da República. Conquistou desafetos, afundou candidaturas estaduais e presidenciais – entre elas as de Roseana Sarney e de Aloisio Mercadante – e ele próprio decidiu se aventurar pelo mundo político como candidato a governador pelo Tocantins nas últimas eleições estaduais.
A incursão de Avelar pela política foi fartamente retratada pela imprensa do Tocantins, onde o procurador surgiu como candidato de Marina Silva e Eduardo Campos. "Quem tem medo de Mário Lúcio Avelar?", perguntou o suplemento do Jornal Opção para o Tocantins, em reportagem publicada na edição de 16 a 22 de fevereiro de 2016. "Procurador da República que botou Jader Barbalho na cadeia assume a pretensão de ser candidato a governador do Tocantins, confirma entendimento com o PSB dos presidenciáveis Eduardo Campos e Marina Silva e chega provocando mal-estar na cena política do Estado", afirmava a reportagem.
O Opção relatou que o "procurador da República Mário Lúcio Avelar está de volta ao Tocantins para ser candidato ao governo do Estado, trilhando a perspectiva de repetir o fenômeno Carlos Amastha (eleito prefeito de Palmas como alternativa aos grupos políticos que dominavam a cena política na capital tocantinense). A previsão, segundo a reportagem, era de que seria "duramente combatido por forças que se sentem ameaçadas com a sua presença". As razões para o "incômodo" são conhecidas: Mário Lúcio Avelar se tornou conhecido por produzir e divulgar operações que incomodaram políticos, mas não deram em nada.
Agora, na Operação Decantação, o procurador também confundiu a opinião pública ao misturar detalhes das investigações com assuntos relacionados a outras áreas, como a gestão de Organizações Sociais (OS). Nos bastidores, os delegados da Polícia Federal condenaram a postura do procurador de, em entrevistas concedidas em paralelo para veículos de Goiás e outros Estados, trazer à pauta temas que não estão relacionados com as investigações.
Para se viabilizar candidato, Mário Lúcio deu provas concretas de sua capacidade de articulação política. Focou e foi em busca do PSB do então presidenciável Eduardo Campos, a partir de sugestão da ex-senadora Marina Silva – que acabou disputando o Palácio do Planalto com a morte de Eduardo Campos no desastre de avião, em Santos, em plena campanha eleitoral de 2014. As reportagens sobre Avelar lembram que ele conquistou Marina por sua atuação "no combate ao desmatamento em Mato Grosso, com enorme rigor".
Partidos ligados ao PT também foram assediados
Apesar da preferência pelas legendas próximas ao PSB e à Rede de Marina Silva, Avelar também articulou sua candidatura ao governo do Tocantins com PDT, PCdoB e PSol. No caso do PSB, teve de enfrentar a resistência do grupo de Siqueira Campos, ao qual o partido é historicamente ligado no Estado. A candidatura provocou controvérsia, conforme a imprensa local, porque o procurador caiu de para-quedas no Tocantins.
"A postulação de Mário Lúcio Avelar divide opiniões. Para os governistas, a candidatura do procurador não tem legitimidade. O procurador não mora no Tocantins nem tem militância política no Estado", afirmou o jornal Opção. "É preciso ressaltar que Avelar ainda não tem a mínima garantia de que será candidato. Como ainda não tem domicílio eleitoral nem filiação partidária não pode nem dizer que será candidato, pois ainda não possui as condições mínimas para tal", relatou o semanário. Dito e feito: assim como na Operação Decantação, Mário Lúcio Avelar fez muita fumaça política, mas também ali havia pouco fogo.
Operações que não deram em nada afundaram candidaturas
O procurador Mário Lúcio Avelar se tornou conhecido por coordenar investigações que não deram em nada na Justiça, mas deixaram para trás um rastro de devastação de biografias. Que o digam a ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney e o ex-senador Aloisio Mercadante (PT), que viram suas candidaturas à Presidência e ao governo do Estado de São Paulo, respectivamente, naufragarem graças a dossiês produzidos pelo procurador. Os dois casos são conhecidos no País. Em 2002, a então pré-candidata do PMDB ao Palácio do Planalto, Roseana Sarney, que liderava as pesquisas, viu sua postulação virar água depois que uma operação revelou a existência de dinheiro vivo guardado no escritório do marido, Jorge Murad. Em 2006, Mercadante foi o alvo principal de Mário Lúcio Avelar, que revelou para o País a existência de um suposto dossiê produzido pelo petista e seus aliados para prejudicar candidaturas do PSDB.
O alvo de Mário Lúcio Avelar agora é o PSDB de Goiás, com a deflagração da Operação Decantação. À medida em que apuração avança, fica claro que, sob o comando do procurador, as investigações têm muita fumaça para pouco fogo. Diversas inconsistências já foram detectadas na apuração e na segunda-feira a Justiça Federal discordou com o pedido do procurador para converter em prisão preventiva a prisão temporária dos ex-diretores da Saneago José Taveira e Afrêni Gonçalves.
PF: desnecessária a apreensão
A Polícia Federal considerou desnecessárias medidas de execução da Operação Decantação (apreensão de documentos, condução coercitiva, entre outras) contra 20 das pessoas arroladas na apuração. Mesmo assim, o Ministério Público Federal (MPF) solicitou a execução das medidas à Justiça Federal, que deferiu os pedidos.
Em todas as operações anteriores, o procedimento foi bem diferente: a PF elencou as medidas a serem tomadas e o MPF apenas endossou com elas. Desta vez, o MPF resolveu pedir a execução de medidas sem o pedido prévio da PF. Também foi considerada desnecessária pela PF a apreensão de documentos em Diretório do PSDB. Mesmo assim, o Ministério Público Federal pediu a apreensão e a Justiça Federal acatou.
Além disso, a prisão da empresária Nilvane Tomas de Sousa Costa foi considerada arbitrária e revogada após decisão da desembargadora Neuza Maria Alves da Silva, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. A magistrada revogou o decreto expedido pelo juiz federal da 11ª Vara da Justiça Federal em Goiás, Eduardo Pereira da Silva, e concedeu habeas corpus à empresária.
De acordo com a decisão da desembargadora, não havia fundamentos para que a investigada seja penalizada com a prisão temporária. Neuza Maria determinou que a empresária seja colocada imediatamente em liberdade. Nilvane Tomas é sócia da empresa Sanefer Construções e Empreendimentos Ltda. O pedido de habeas corpus foi protocolizado no Tribunal Regional Federal pelos advogados Cleber Lopes de Oliveira, Marcel Andre Verrinai Cardoso e Rainer Serrano Rosa Barbosa.