O presidente do diretório Fluminense do PSDB, Paulo Marinho, divulgou um dia após a morte do ex-ministro Gustavo Bebianno, a carta que o advogado escreveu para o presidente Jair Bolsonaro.
O ex-coordenador da campanha do Bolsonaro, morreu aos 56 anos em seu sítio em Teresópolis após sofrer um enfarte na madrugada de sábado.
A carta foi entregue ao ministro Onyx Lorenzoni (cidadania), ao general Maynard Santa Rosa e ao ator Carlos Vereza, para que enviassem ao Bolsonaro. Lorenzoni confirmou ao advogado que o presidente lera o texto.
Bebianno se dirige ao presidente de "meu capitão" e inicia o texto citando um trecho bíblico "E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará". Na carta o ex-ministro diz que o presidente sabe o quanto ele se dedicou na sua eleição, e que Bolsonaro não chegaria ao seu cargo sem sua ajuda.
"Trabalho que só deu certo porque fiz, acima de tudo, com AMOR- amor que intensamente desenvolvi por você. Amor hétero, como costumávamos brincar". escreveu Bebianno.
Na carta ele diz que o presidente para manter o vínculo afetivo com o filho considerado mais radical, vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), "embarca nessas fantasias, nessas paranoias, nas eternas teorias de conspiração". O ex-ministro chega a dizer que Bolsonaro é "obsediado pelo próprio filho".
O advogado afirma que o presidente "cultiva e alimenta teorias de conspiração, intrigas e ódio, e ensinou seus filhos a fazerem o mesmo".
O ex-ministro foi demitido com apenas 49 dias de governo devido à atritos com Carlos Bolsonaro. Ele escreveu que iria embora em paz e que nunca traíra o presidente.
Leia a íntegra da carta
Meu capitão,
Ao longo de dois anos, ouvi essa frase sair da sua boca quase todos os dias, como que de forma automática.
Isso, além de outras coisas, fazia-me acreditar que o senhor era um homem justo, bom, leal e amigo. Acima de tudo, corajoso!
Dediquei dois anos da minha vida para defender uma causa apelidada de Mito. E eu acreditei nesse Mito com todas as minhas forças, com todo o meu coração.
O senhor SABE disso. Por mais que, agora, o senhor tente banalizar tudo o que fiz, para alívio da própria consciência, o senhor SABE que não chegaria até aqui sem o trabalho que fiz (trabalho que só deu certo porque fiz, acima de tudo, com AMOR — amor que intensamente desenvolvi por você. Amor hétero, como costumávamos brincar).
O senhor mesmo costumava verbalizar essa verdade para algumas pessoas do nosso convívio. Essas pessoas também sabem, também conhecem essa verdade. Mas o que importa, de fato, é que o senhor, homem Jair Bolsonaro, SABE: sempre estive ao seu lado, e do seu lado, durante toda essa jornada, sem importar o preço a ser pago.
Ainda que o senhor bata a cabeça, tome remédios, se encha de raivas criadas por fantasias exóticas e curiosas, o FATO, a VERDADE, continuará lá no fundo da SUA consciência, impressa na SUA alma.
Por isso, não vou tomar o seu tempo dissertando sobre as coisas que fiz, acreditando estar, principalmente, trabalhando para o bem do meu país.
O senhor está obsediado. Obsediado pelo próprio filho. Carlos precisa de ajuda e só o senhor tem esse poder. Não estou falando com rancor. Meu sentimento não é de raiva, acredite. Não tenho uma só gota de raiva do Carlos (a que tive, já passou, graças a Deus), porque ele precisa de ajuda. Isso é visível aos olhos de TODOS.
Falando dessa forma direta, o senhor talvez não entenda. Por isso, tentarei lhe explicar um pouco mais esse meu sentimento.
Carlos vive em uma prisão mental e emocional. Ele sofre intensamente em função do próprio ódio. Ele cultiva esse ódio contra tudo e contra todos, principalmente contra as pessoas por quem o senhor demonstra AFETO. E o senhor também sabe dessa VERDADE. Ele é consumido pelo ódio 24 h por dia, independentemente do que esteja acontecendo no mundo real.
A despeito do que, de fato, esteja acontecendo no mundo real, por melhores que possam ser as circunstâncias, Carlos continua odiando e sofrendo. Mesmo o senhor tendo alcançado o objetivo de ser eleito, ele permanece odiando. Ele aprendeu a ser assim e não sabe fazer de outra forma. Não é por mal, ele não tem culpa, simplesmente não sabe fazer diferente.
E o senhor tem alimentado essa situação. E isso só vai mudar quando o senhor RECONHECER A VERDADE.
Para manter o vínculo afetivo com ele, para manter a conexão física e emocional, o senhor embarca nessas fantasias, nessas paranoias, nas eternas teorias de conspiração.
Carlos aprendeu a ser assim com o senhor. Foi o senhor que o ensinou, desde pequeno, a viver em confronto. Vide o que assumiu contra a própria mãe, ainda quando jovem. Essas experiências deixam marcas, Capitão. A mente humana é muito profunda e complicada. É bom estar preparado para confrontos. Viver em permanente estado de beligerância nubla a mente e a existência.
O seu erro tem sido fazer exatamente o contrário daquilo que prega. O seu pecado é, nesse caso, não RECONHECER A VERDADE. E, portanto, não se libertar (nem libertar o próprio filho, que é o que mais sofre).
Ao agir assim, o senhor se mantém preso, mantém o seu filho preso, e gera um rastro terrível de destruição à sua volta. O senhor destrói os seus principais amigos e aliados. O senhor se torna uma pessoa injusta com os outros. Além disso, alimenta e incentiva o comportamento viciado do filho, impedindo-o de se libertar do ódio.
Tenha certeza de que, daqui a pouco tempo, o problema envolverá outra pessoa, e depois outra, e depois mais outra, num rastro interminável de ódio e destruição. Leia a Bíblia e veja as consequências invariáveis decorrentes do ódio. O ódio é uma energia terrível e incontrolável que tudo destrói. O ódio abre o canal de sintonia com o que há de pior no mundo espiritual.
Acredite: sem saber, sem querer e sem perceber, Carlos se tornou um canal aberto para influências espirituais negativas. Ele se tornou obsediado. E, por consequência, obsedia o senhor. Isso é um círculo vicioso terrível! O mal opera por aí. Ao contrário do que muita gente pensa, o mal nem sempre age pelas mãos de Adelios. Na maioria das vezes, age de forma ardil e sub-reptícia, pela mente de pessoas próximas a nós, que nos amam e a quem também amamos. Acredite nisso, Capitão.
O mal opera utilizando as fraquezas de cada um (ou, como se diz no jargão religioso, pelo pecado). Se a pessoa tem a tendência de beber, será influenciada a beber. Se a pessoa tem a tendência a sentir ciúmes, será colocada em circunstâncias propícias a sentir ciúmes. Se a pessoa tem a tendência de odiar, essa será a ferramenta usada).
No seu caso, essa é a chave por meio da qual o mal opera. É por meio do seu próprio pecado. O senhor cultiva e alimenta teorias de conspiração, intrigas e ódio, e ensinou seus filhos a fazerem o mesmo. O melhor discípulo foi o Carlos, pois é o que tem maior conexão espiritual com você. O problema é que ele é muito forte, muito intenso, e o senhor perdeu o controle sobre o “pitbull”. Hoje, ele morde aleatoriamente as pessoas, sem que o senhor consiga segurá-lo. Pior do que isso, quando o senhor tenta segura-lo, ele se vira e morde o senhor mesmo
E, com esse canal aberto, o mal segue operando. Os obsessores instigam vocês dois a desconfiarem das pessoas e sentirem o ódio. Vocês ficam cegos e sentem o ódio contra alguém injustamente — como no meu caso — e atacam. A vítima do ataque também passa a sentir ódio, pois foi atacada (no meu caso, fui atacado injustamente em público). Ao sentir ódio, eu também tenho vontade de atacar, de retribuir a agressão. E, assim, o círculo vicioso se amplia, num rastro sem fim de destruição, cumprindo a missão dos obsessores que pretendem manter o BRASIL no mesmo padrão moral inferior.
Portanto, meu amado Capitão, só há uma forma de isso tudo acabar bem, em benefício do nosso BRASIL.
O senhor pode ficar tranquilo. Vou embora em paz. Quero apenas que dê certo. Não posso crer que tudo o que foi feito tenha sido em vão.
Tenha a certeza que nunca o traí. Nunca fiz nada pelas costas. Nunca plantei nota desfavorável ao senhor ou a seus filhos, nunca vazei áudio. Não há complô algum. Talvez o senhor nunca enxergue isso. Mas minha consciência sabe. Isso é o que basta.
Minha missão chegou ao fim aqui. A sua, não. Reconheça seus erros (para si próprio). Faça um profundo exame de consciência. Limpe o seu coração. Recupere o Carlos pelo seu exemplo. Ele vai aprender. Ele é um bom garoto. Só precisa da sua ajuda.
Com informações do Estadão