Por Beatriz Bulla, Pedro Venceslau e Roberta Jansen; colaborou Iancer Porcella
E Deus, família e voto foram a trilogia que animou a primeira semana de campanha oficial dos dois líderes da disputa pela Presidência da República no Brasil. Em segundo lugar nas pesquisas, o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, ao lado da primeira-dama Michelle Bolsonaro, focou, no Rio e em Juiz de Fora (MG), o eleitorado evangélico. Ambos acentuaram ser cristãos - Michelle chegou a dizer que o Planalto estava consagrado a "demônios".
O católico Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder da disputa, também recorreu à retórica religiosa. Em comício em Belo Horizonte (MG), abrandou o discurso de esquerda. Prometeu respeitar a Constituição - e a Bíblia. Ontem, sua campanha ensaiou um recuo, e as duas campanhas avaliavam os limites da tática.
Bolsonaro, por sua vez, falou em "paz no coração", "fé" e "amor" ao se dirigir aos desembargadores na cerimônia de instalação do Tribunal Regional Federal da 6.ª Região, no Palácio das Artes, na capital mineira. "Agradeço a Deus por essa oportunidade, pela minha segunda vida e pela missão de ser presidente da República "
Espaço
Com esse tom religioso, o presidente parece querer repetir 2018. Naquele ano, o apoio evangélico foi fundamental para a vitória sobre Fernando Haddad (PT). Bolsonaro também parece buscar uma zona de conforto, um espaço onde esteja com boa vantagem sobre Lula, que, segundo as mais recentes pesquisas, poderia vencê-lo no primeiro turno. No Datafolha de agosto, no eleitorado evangélico, o presidente ganha por 49% a 32%. Os números gerais são o inverso: 47% para o petista e 32% para o postulante do PL
Aliados de Bolsonaro dizem que o discurso com forte tom religioso da largada da campanha não faz parte de estratégia previamente traçada. Mas está no DNA do candidato e continuará fazendo parte dos discursos, em especial de Michelle. A leitura na trincheira bolsonarista é que o nicho do eleitorado evangélico está consolidado.
Diferentemente do que Bolsonaro diz nas ruas, o foco da narrativa nas redes sociais e no horário eleitoral na TV deve ser a economia. O objetivo é ampliar o apoio ao presidente entre os mais pobres, com renda de até dois mínimos.
Discurso
Apesar das referências religiosas do discurso de Lula, sua campanha quer evitar entrar na "guerra santa" que diz estar sendo encampada por Bolsonaro. Aliados do petista avaliam que a batalha de acusações entre "quem é mais cristão" é uma provocação de Bolsonaro que atrapalha o discurso do PT, de mirar as mazelas econômicas.
O próprio Lula deu o tom do discurso, nesta sexta, 19, ao responder a perguntas de jornalistas no QG da campanha presidencial, em São Paulo. "Eu não quero ficar disputando o voto religioso porque não faz parte da minha cultura política estabelecer qualquer princípio de guerra santa numa política", declarou o ex-presidente.
Em busca de uma espécie de blindagem, Lula também tem citado duas leis aprovadas no seu governo: a da liberdade religiosa e a que criou o Dia Nacional da Marcha para Jesus. "Eu quero conversar com os eleitores brasileiros enquanto cidadãos brasileiros", disse.
Pesquisas
A pegada religiosa dos líderes da campanha presidencial não é coerente com as pesquisas de opinião. Pesquisa Genial/Quaest de agosto, por exemplo, apontou que, para 40% dos eleitores, o principal problema do Brasil é a economia e para 21%, são questões sociais (veja gráfico).
O cientista político José Álvaro Moisés, do Instituto de Estudos Avançados da USP, disse acreditar que a estratégia da "guerra santa" adotada pela campanha de Bolsonaro e espelhada pela de Lula "é de mau gosto e inadequada". Sobretudo, afirmou, ao combinar valores religiosos com política, "o que não é bom para a democracia". Em sua análise, trata-se de "apelo meio desesperado".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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