Um estudo liderado pelo Imperial College, de Londres, e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2016, revela que a obesidade atinge 124 milhões de crianças, um salto quase duas vezes superior ao aumento no número de adultos obesos.
Levantamentos comprovam que, em 1975, o segmento da população entre 5 e 19 anos acima do peso era de 11 milhões. Já o de adultos saltou de 100 milhões para 671 milhões. Nas últimas 4 décadas, o índice de obesos no mundo cresceu de 0,7% para 5,6% entre meninas; e de 0,9% para 7,8% em meninos. O Brasil encontra-se acima da média mundial: 9,4% das meninas e 12,7% dos meninos estão obesos.
A obesidade pode ser desencadeada por fatores ambientais, biológicos, hereditários e psicológicos, mas, segundo especialistas, certamente são os hábitos os principais causadores. “Menos de 5% dos casos são decorrentes de doenças endocrinológicas e a hereditariedade só se manifestará se o ambiente permitir”, explica a endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM-PR), Rosana Bento Radominski.
De acordo com ela, os índices de sedentarismo e a alimentação inadequada no ambiente familiar são os principais colaboradores para o crescimento exponencial no número de crianças e adolescentes obesos. “As crianças estão passando muito tempo em frente ao computador e celular e fazendo pouca atividade física”, reforça a médica. “Além disso, é preciso uma mudança de hábitos na alimentação de toda a família para que a criança seja motivada a se alimentar melhor”.
Rosana ressalta ainda que há poucas opções de medicamentos para auxiliar no emagrecimento infantil. Observa que o tratamento ideal ainda é baseado em atividade física e reeducação alimentar. A especialista acrescenta que tratar a obesidade não é uma questão estética e os problemas de saúde relacionados ao excesso de peso vêm afetando crianças cada vez mais novas.
Complicações como hipertensão arterial, colesterol e triglicerídeos elevados, resistência à insulina (que pode evoluir para o diabetes tipo 2) e até mesmo apneia de sono são alguns desses problemas. “A obesidade nos meninos é ainda mais grave devido ao acúmulo de gordura abdominal, que traz maior risco de problemas cardiovasculares”, alerta a médica.
ASPECTOS PSICOLÓGICOS
A família também deve considerar os aspectos psicológicos da obesidade infantil. Especialistas apontam que conforme o avanço na idade, maior a probabilidade de sofrer preconceito e bullying devido ao excesso de peso. Isso afeta a interação da criança com os grupos, a socialização e pode levar até mesmo a um quadro de depressão.
“É um círculo vicioso: a criança sofre com a diferença, se isola e tende a praticar menos atividades físicas e compensar a tristeza na alimentação”, revela a endocrinologista.
Outro fator importante a ser observado é se o quadro de obesidade não é decorrente de fatores psicológicos. Muitas vezes, desequilíbrios emocionais e até mesmo casos de abuso sexual desencadeiam a doença. Nesses casos, o acompanhamento de psicólogos e uma equipe multidisciplinar é essencial.
CONDUTA SAUDÁVEL
Além das atividades físicas, é importante que os pais incentivem uma alimentação equilibrada e rica em frutas e verduras. Para a nutricionista Ana Paula Henrique, o processo de aprendizagem é um dos fatores determinantes do comportamento alimentar da criança. Segundo ela, esse condicionamento está associado a três fatores: a sugestão de sabor dos alimentos, a consequência pós ingesta da alimentação e o contexto social.
“Normalmente os pais se concentram na quantidade de alimentos e não em desenvolver hábitos e atitudes direcionados à qualidade dos alimentos. Temos duas situações frequentes: na primeira, se a criança experimenta e não gosta, não há uma nova oferta do alimento e na segunda se a criança gosta, existe uma nova oferta, mas é preciso saber a função desse alimento, em que sentido ele faz bem. E para desenvolver hábitos é preciso ter um horário definido para alimentação e incentivar a criança a fazer uma atividade física”, orienta.
Rosana Bento reafirma a importância da participação de toda a família no tratamento e prevenção da obesidade. “Comer de forma saudável não é recomendação exclusiva para o paciente obeso. Toda a família deve cuidar da alimentação e não deve haver diferenciação entre magros e obesos. Uma dieta nutricional equilibrada faz bem a todos”, afirma. A atividade física também deve ser equilibrada e fazer parte do cotidiano.
“Não basta matricular a criança em uma academia. É preciso incentivar hábitos diários mais saudáveis como caminhar todos os dias, procurar subir escadas e brincar, por exemplo”, reforça a médica.Outra dica importante é regular o tempo da criança em frente às telas de computador, celular e televisão – o que não deve exceder mais que duas horas diárias. E também buscar ajuda em grupos de apoio ao tratamento da obesidade.
O tema “Obesidade na infância” será abordado por Rosana Bento Radominski no VI Encontro Brasileiro de Endocrinologia Pediátrica (EBEP), que acontece em Curitiba, de 24 a 26 de maio. O assunto fará parte da mesa “Obesidade e Metabolismo”, coordenada por Silmara Leite, presidente da SBEM-PR. “Debater o tema obesidade infantil entre os endocrinologistas é de extrema importância. É importante que a população tome medidas urgentes na mudança de hábitos para termos uma população mais saudável futuramente”, alerta Silmara.