O mês de setembro é dedicado à conscientização sobre a importância da prevenção ao suicídio. A campanha “Setembro Amarelo” teve início em 2014, organizada em parceria entre a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e o Conselho Federal de Medicina (CFM). O dia 10 deste mês é, oficialmente, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas ações ocorrem durante todo o ano. “A vida é a melhor escolha!” é o lema da campanha 2022.
ORIGEM DO SETEMBRO AMARELO
A campanha teve início nos Estados Unidos em 1994, quando o jovem de 17 anos, Mike Emme, se suicidou. Mike era conhecido por ser caridoso e habilidoso, habilidade essa que o levou a restaurar o próprio carro, um Mustang 68, e em seguida pintou o automóvel de amarelo. Devido ao seu feito, antes de sua morte, o jovem havia ficado conhecido como “Mustang Mike”. Em seu funeral, uma cesta com 500 cartões com fitas amarelas presas a eles, foi disponibilizada por seus amigos visando pessoas que precisavam de apoio. Os cartões continham a seguinte mensagem: “Se você precisar, peça ajuda!”. Em pouco tempo a mensagem se espalhou por todo o país e ligações começaram a chegar com pedidos de ajuda, especialmente vindas de adolescentes.
Somente em 2003, foi instituído pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o dia 10 de setembro como o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio. A inspiração da cor escolhida para representar a fita, símbolo da campanha, foi o amarelo do Mustang de Mike.
De acordo com a OMS, em 2019 foram registrados mais de 700 mil casos de suicídio em todo o mundo. No Brasil, são 14 mil mortes anuais, uma média de 38 suicídios por dia, números que ultrapassam mortes causadas por HIV, malária ou câncer de mama, por exemplo. Segundo o IBGE, mais de 10% da população adulta do Brasil sofre com a depressão, doença que ainda desdenhada e desacreditada em muitos casos. Dados da OMS apontam que 90% dos casos de suicídio poderiam ser evitados, se as vítimas tivessem acesso ao tratamento e acompanhamento psiquiátrico e informações de qualidade.
Com o intuito de dar visibilidade ao tema e fomentar a reflexão e o diálogo a acerca da conscientização e prevenção ao suicídio e dos cuidados com a saúde mental evitando desenvolver doenças psicológicas, o DM entrevistou a Psicóloga Andressa Tavares, que esclarece todas essas questões. Confira na íntegra:
Falar sobre o suicídio é um tabu no Brasil? Se sim, isso dificulta a abordagem do tema e a conscientização entre as pessoas?
Falar sobre morte no Brasil é tabu! Não sei te falar como é isso fora do nosso país, mas aqui segue esse rumo. Mesmo casos de pacientes terminais e em processo de morte, as pessoas temem falar do assunto, como se não falar adiaria ou até impediria sua chegada. E falando especificamente de autocídio tem-se a ideia que falar sobre gera gatilhos e até cria a possibilidade para pessoas. O que não é de tudo mentira. Falar sobre o tema demanda muito cuidado, não sabemos quem é e como está o receptor da mensagem. Mas, por outro lado, não falar afasta qualquer proposta de prevenção, pósvenção, criação de redes de apoio e canais de conscientização. Existem leis de como a mídia deve abordar o tema, escolas tem manuais, órgãos de saúde desenvolvem melhores estratégias de dialogar. Aqueles que se dispuserem a falar precisam buscar essas informações, para que a comunicação liberte e não aprisione mais. E sempre que falar sobre trazer onde buscar ajuda. É fundamental!
Existem sinais que uma pessoa costuma apresentar que podem indicar a presença de ideias suicidas? Ao perceber alguns desses sinais, como estar preparados para ajudar?
Não podemos ir para um pensamento simplista e unilateral. O suicídio é multifatorial. As pesquisas indicam alguns fatores mais comuns (lembrando que pode combinar mais do que um):
- Fatores psiquiátricos e psicológicos (Depressão, bipolaridade, por exemplo)
- Fatores econômicos
- Fatores sociais e culturais
- Fatores genéticos
- Histórico familiar
- Fatores religiosos
Além disso, os estudos da área também trazem grupos de riscos:
- Os enlutados
- Pessoas que viveram abandonos
- Vítimas de violações de direitos
- Fracasso escolar/profissional
- Falta de reconhecimento e valorização
- Grupos minoritários: mulheres, LGBTQIAP+
No que se refere à ajuda, sempre buscar ajuda médica especializada. Diante de alguma fala da pessoa, ou tentativa não concretizada, não pensar que é drama, querer chamar atenção. Ainda que seja um pedido de socorro, o caminho não é olhar com acusações e críticas, e sim com acolhimento e empatia.
Qual a importância de falar sobre saúde mental? Como pessoas sem transtorno iminente podem cuidar da saúde mental evitando desenvolver doenças?
Toda! Falar, pensar e ler sobre saúde mental é a base de uma sociedade mais saudável. Fazer psicoterapia não é “coisa de doido”. Sair dos estigmas em busca do autoconhecimento, do tratar de feridas mal cicatrizadas. Existem psicoterapias e atendimento psiquiátrico gratuito, a baixo custo e particular, de diversas abordagens e com diversos profissionais. É a pessoa permitir-se a entrar no processo.
Quando uma pessoa comete suicídio, logo se pensa na vítima. Mas como é possível trabalhar o luto de familiares nestes casos?
Essa é outra pergunta que não tem uma resposta correta. Cada caso é um caso, cada história é uma história, cada abordagem terapêutica têm suas particularidades. Explicar isso aqui seria limitar muito o trabalho de saúde mental. De forma bem geral, tratamento psiquiátrico aliado ao psicológico. Ter conhecimento que o enlutado é um grupo de risco, então seguir as diretrizes de prevenção com essa pessoa. Equipe de saúde em contato para alinhar intervenções. Levantar crenças da pessoa e ir caminhando. Nem de longe é um caminho fácil, mas com acompanhamento é um caminho mais seguro.
Com iniciativas, a campanha 'Setembro Amarelo' busca diminuir os índices de suicídio. Qual a importância do programa e, de forma concreta, o que ele desenvolve, como atua?
A campanha traz o tema para a pauta de políticas públicas, atenção primária de saúde e possibilidade de dar voz aqueles que sentem as dores e não sabem onde pedir ajuda. Informações cuidadosas e bem elaboradas podem salvar vidas.
É possível previnir o suicídio?
Sim! Olhar, de verdade, aqueles que estão próximos para ver pequenas mudanças no comportamento e investigar o que é. Acreditar que isso não está longe de você (achar que não acontece com a gente, sabe?). Não desvalorizar dores, dificuldades, medos e inseguranças. Acolhê-las e respeitar as dificuldades individuais. Acreditar que saúde mental é coisa séria e que demanda tratamento como qualquer outra questão de saúde. A prevenção começa no nosso micro mundo (nossas casas, trabalhos, escolas) e vai para o mais amplo (sociedade, cultura, espiritualidade, moral). Além de ver no outro, olhar as próprias necessidades de apoio. Isso não é fraqueza. Pelo contrário, assumir suas dores demanda muita coragem e força.
SE PRECISAR, PEÇA AJUDA
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial.
SAMU –Serviço de Atendimento Móvel de Urgência 192.
CVV – Centro de Valorização da Vida através do número 188.
SALVE VIDAS
No site setembroamarelo.com, página da campanha, é possível encontrar materiais de uso público, com diretrizes para a divulgação e compartilhamento, vídeos, agenda da campanha, materiais disponíveis para download e a Cartilha Suicídio Informando para Prevenir.
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