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Obesidade: especialistas sugerem mudanças no diagnóstico e novas abordagens

Índice de Massa Corporal (IMC) deixa de ser único parâmetro para a identificação da doença

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Pesquisadores de diferentes países, incluindo o Brasil, propõem uma reformulação no diagnóstico da obesidade. A principal crítica é que o Índice de Massa Corporal (IMC) não é um parâmetro confiável se utilizado isoladamente para determinar a doença. O IMC, segundo os especialistas, não é uma medida direta de gordura, não reflete sua distribuição ao redor do corpo e não oferece informações sobre a saúde individual.

Os pesquisadores recomendam que o IMC seja utilizado apenas como uma medida substituta para identificar o risco à saúde em nível populacional, em estudos epidemiológicos ou para triagem. Atualmente, são considerados com sobrepeso os indivíduos com IMC igual ou superior a 25, e com obesidade, aqueles com IMC igual ou acima de 30.

A nova abordagem sugere que, além do IMC, devem ser considerados a análise do acúmulo de gordura corporal e outros componentes clínicos.

O tema foi abordado em um artigo publicado na revista The Lancet Diabetes & Endocrinology, elaborado pela Comissão sobre Obesidade Clínica, que conta com a participação de 58 especialistas de diversas áreas, como endocrinologia, medicina interna, cirurgia, biologia, nutrição e saúde pública, além de representantes de pessoas com obesidade. A discussão foi endossada por 75 organizações médicas de todo o mundo.

Para a medição de gordura corporal e sua distribuição, a comissão recomenda alguns métodos, como:

• Pelo menos uma medição do tamanho corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril ou cintura-altura) em complemento ao IMC;

• Ao menos duas medições do tamanho corporal, independentemente do IMC;

• Medição direta da gordura corporal (por meio de densitometria óssea ou Dexa), independentemente do IMC;

• Em pessoas com IMC muito alto — por exemplo, acima de 40 — pode-se presumir a presença de adiposidade.

Além disso, o grupo propõe um novo modelo diagnóstico para doenças relacionadas com a obesidade, que passa a ser dividido em duas categorias: pré-clínica e clínica.

“Agora, obesidade é definida como o tamanho da pessoa. E o que fizemos foi defini-la como doença crônica e progressiva, com sinais e sintomas pertinentes”, afirma Ricardo Cohen, coautor do estudo, chefe do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e presidente mundial da Federação Internacional de Cirurgia da Obesidade e Distúrbios Metabólicos.

Ele explica ainda que a obesidade pré-clínica é caracterizada por casos em que o paciente não apresenta sinais e sintomas, embora tenha um IMC mais alto e excesso de adiposidade. “Apesar disso, o paciente tem apenas um fator de risco relacionado à sua doença, o que altera as estratégias de tratamento”, diz Cohen.

De acordo com o especialista, quem tem obesidade clínica deve ser tratado imediatamente, enquanto os pacientes com obesidade pré-clínica precisam de estratégias de prevenção, dependendo do risco individual.

Os autores do estudo definiram 18 critérios para diagnóstico de obesidade clínica em adultos e 13 para crianças e adolescentes.

Segundo Cohen, a nova metodologia pode ser aplicada globalmente, mas os fatores de risco podem variar conforme a região. “Cada risco dos pacientes com obesidade pré-clínica, por exemplo, pode ser diferente entre quem mora no Brasil e na Índia. A medicina hoje é de precisão, individualizada”, afirma.

A comissão global enfatiza que a proposta oferece um diagnóstico mais refinado e preciso sobre o que significa viver com obesidade, reconhecendo que nem todas as pessoas com excesso de gordura corporal possuem uma doença instalada, mas muitas estão em risco e necessitam de acompanhamento adequado.

O que dizem os especialistas

O coordenador da Comissão Internacional da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Paulo Augusto Carvalho Miranda, considera que a combinação de medidas antropométricas com uma análise clínica individualizada torna o diagnóstico mais humano e facilita a implementação de melhores protocolos de tratamento e alocação de recursos. “Esse é um documento internacional. O papel dos especialistas e das entidades governamentais seria discutir profundamente o tema para desenvolver um documento nacional que se adapte às nossas condições de recursos”, afirma o endocrinologista.

A diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO), Cynthia Valério, vê a nova abordagem como um avanço importante. “Contar apenas com o IMC para definir pessoas com obesidade é insuficiente e tem limitações. Você acaba deixando de tratar muitas pessoas e tratando outras que não têm tanta indicação”, diz a especialista. Ela também sugere que os critérios para a definição de obesidade sejam revisados e aprimorados. “Algumas definições são mais subjetivas ou insuficientes e dependem da avaliação clínica, o que envolve também a visão do médico sobre o paciente”, completa Valério.

O IMC

O IMC foi criado pelo matemático e estatístico belga Lambert Adolphe Quetelet, em 1832, com o objetivo de estudar a relação entre altura e peso nas populações humanas. A fórmula para o cálculo do IMC é simples: basta dividir o peso (em quilogramas) pela altura (em metros) ao quadrado. O IMC foi adotado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nos anos 1970 como uma medida para classificar o peso corporal.

De acordo com a ABESO, a classificação do IMC é a seguinte:

• Abaixo do normal: menor ou igual a 18,5 kg/m²

• Normal: entre 18,6 e 24,9 kg/m²

• Sobrepeso: de 25 a 29,9 kg/m²

• Obesidade grau 1: 30 a 34,9 kg/m²

• Obesidade grau 2: 35 a 39,9 kg/m²

• Obesidade grau 3: maior ou igual a 40 kg/m²

Critérios de diagnóstico para obesidade clínica segundo a nova publicação

Adultos

• Sinais de aumento da pressão intracraniana, como perda de visão e/ou dores de cabeça recorrentes

• Apneia/hipopneia durante o sono

• Falta de ar e/ou chiado

• Insuficiência cardíaca

• Fibrilação atrial crônica

• Hipertensão arterial pulmonar

• Fadiga crônica

• Trombose venosa profunda recorrente e/ou doença tromboembólica pulmonar

• Aumento da pressão arterial

• Altos níveis de triglicerídeos e baixos níveis de colesterol HDL

• Esteatose hepática não alcoólica

• Microalbuminúria com redução da taxa de filtração glomerular (TFG)

• Incontinência urinária recorrente/crônica

• Ausência de ovulação, alteração do ciclo menstrual e síndrome dos ovários policísticos

• Hipogonadismo masculino

• Dor crônica e intensa no joelho ou quadril associada à rigidez articular e redução da amplitude de movimento articular

• Linfedema nos membros inferiores causando dor crônica e/ou redução da amplitude de movimento

• Limitações das atividades do dia a dia

Crianças e adolescentes

• Perda de visão e/ou dores de cabeça recorrentes

• Apneias/hipopneias durante o sono devido ao aumento da resistência das vias aéreas superiores

• Falta de ar e/ou chiado

• Aumento da pressão arterial

• Conjunto de hiperglicemia/intolerância à glicose com perfil lipídico anormal (níveis elevados de triglicerídeos ou colesterol LDL alto ou colesterol HDL baixo)

• Aumento das enzimas hepáticas devido à doença hepática gordurosa associada à disfunção metabólica microalbuminúria renal

• Incontinência urinária recorrente/crônica

• Síndrome dos ovários policísticos

• Dor recorrente/crônica ou tropeçar/cair devido a pé plano ou mau alinhamento das pernas

• Dor recorrente/crônica ou limitação de mobilidade devido a distúrbio assimétrico da tíbia que causa deformidade

• Dor aguda e/ou recorrente/crônica, ou limitação de mobilidade, ou tropeçar/cair devido à epífise capital femoral escorregada

• Limitações das atividades do dia a dia

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