Foram quatro meses entre o primeiro encontro e o grande dia: do encontro inicial entre diferentes gerações e o dia em que um desfile conectou, por meio de saberes e afetos, jovens estudantes de Design de Moda e bordadeiras da Cidade de Goiás/GO.
No dia 12 de setembro do ano passado, um grupo de estudantes do curso de Design de Moda da Universidade Federal de Goiás (UFG), coordenado pela professora Lorena Abdala, visitou a Casa Coralinas, na Cidade de Goiás, para conhecer as bordadeiras da Associação Mulheres Coralinas (Ascoralinas).
Os dois grupos se reuniram para conversar sobre o projeto 14º FAV Fashion: Mulheres Coralinas, contemplado na segunda edição do processo seletivo promovido pelo RE-FARM CRIA, do Instituto PrecisaSer.
“Como as alunas e alunos estavam elaborando peças de roupas inspiradas na arquitetura da Cidade de Goiás, a proposta era que as Mulheres Coralinas integrassem esse processo de criação, num diálogo que unisse os fundamentos do design aos conhecimentos tradicionais da arte em bordado, do crochê e da cerâmica. Ao final do processo, no dia 24 de janeiro deste ano, as peças que resultaram dessa colaboração puderam ser vistas no desfile de moda que foi realizado no Centro Cultural da UFG, em Goiânia, explica Ebe Siqueira, secretária-executiva de Ascoralinas.
“Além da participação na confecção das roupas, as Mulheres Coralinas também desfilaram na passarela vestidas com as peças que ajudaram a criar”, complementa.
Valorização do trabalho manual e coletivo
“O processo de cocriarão vivido no 14º FAV Fashion reafirma bases fundamentais da Associação Mulheres Coralinas: construir um ambiente de criação que não hierarquize as diferentes forças
produtivas; elaborar formas de comércio mais justas; e fazer circular os saberes tradicionais, valorizando o trabalho manual feito por mulheres. A Associação aposta no contato entre gerações para potencializar esses objetivos, reverenciando o que as antigas mestras têm a ensinar para a juventude e celebrando o que a juventude pode transmitir às mais velhas”, detalha Ebe.
O mais recente projeto que está sendo realizado pela Ascoralinas se chama “É de Menina que se Torna Coralina”, que consiste na formação de um grupo de 20 meninas, entre 14 a 18 anos, que estão frequentando semanalmente a Casa Coralinas para aprender com as associadas a arte do bordado, gastronomia, cerâmica e encadernação. As alunas também participam de círculos de leitura de textos literários e rodas de conversa em torno de questões de gênero e emancipação feminina.
“As meninas que integram esse projeto têm participado de todas as atividades que acontecem na Casa Coralinas, inclusive bordaram e desfilaram no 14º FAV Fashion”, informa.
Visita ao ateliê de Naya Violeta
No dia 24/01, antes do desfile na 14º FAV Fashion, as meninas e mulheres Coralinas tiveram a oportunidade de visitar o ateliê da estilista afro-goiana Naya Violeta. O vínculo entre a Associação e o Ateliê vem sendo gestado desde o ano passado e agora se estreita com um projeto comum prestes a nascer.
A ideia é que as Coralinas e a equipe do Ateliê Naya Violeta vivam juntas um processo de imersão e se dediquem a leituras coletivas da obra de Leodegária de Jesus, poetisa negra nascida em Caldas Novas/GO que fez da Cidade de Goiás o berço para sua criação artística.
Leodegária é figura fundamental no cenário goiano e nacional. Além de poetisa com dois livros publicados (Coroa de Lírios, em 1906, e Orchideas, em 1928), foi também professora, costureira e atuou na imprensa, com destaque para sua posição de fundadora e redatora do jornal A Rosa, ao lado de Cora Coralina, em 1907.
“O nome de Leodegária se manifesta também como importante referência de uma mulher negra que reafirmou seu lugar de artista com muita força, ao seu modo, à sua época. A partir dessa imersão na vida e obra de Leodegária de Jesus, as Coralinas e o Ateliê Naya Violeta buscarão elementos para desenvolver uma colaboração”, afirma Ebe.
Mulheres Coralinas
A Associação Mulheres Coralinas oferece, na cidade de Goiás, qualificação profissional a mulheres em situação de vulnerabilidade socioeconômica, de modo a potencializar as condições de trabalho
coletivo, possibilitando ações de capacitação, de resgate de saberes tradicionais e de convivência cultural e criativa. A entidade iniciou suas atividades em 2013 e formalizou-se como associação em 2016.
Parceiros
“A atuação das Mulheres Coralinas tem sido marcada pela parceria com o Ministério Público do Trabalho em Goiás (MPT-GO) e com a Justiça do Trabalho, instituições que se empenham na
valorização do trabalho e têm como horizonte a erradicação da violência contra as mulheres, do racismo e de outras formas de opressão que reduzem a possibilidade de construir uma sociedade
mais justa. A maioria de nossos projetos pôde se concretizar graças às destinações de recursos originados de multas e indenizações feitas pelos dois órgãos”, esclarece a secretária-executiva.